General
Com o governo no papel de freguês
Um criador de abelhas que produz mel em seu sítio pode, tanto quanto uma micro ou pequena empresa, se tornar fornecedor do governo federal. Da mesma forma, alguém que tenha um imóvel para alugar pode participar de uma licitação pública, disputando preços com firmas constituídas. São oportunidades que interessam tanto aos empreendedores quanto ao governo.
Por isso, o Ministério do Planejamento vai organizar uma grande feira de contratação pública em julho, em Brasília, numa parceria com o Sebrae: o principal objetivo é aproximar micro e pequenas empresas, além das pessoas físicas, do sistema de compras do governo federal.
É uma grande aposta do governo, que pretende reunir potenciais parceiros, mostrando a eles como oferecer produtos de forma mais organizada.
Atualmente, essas negociações são feitas por pregões eletrônicos realizados na internet, com ajuda do portal Comprasnet. Além de promover a feira, o ministério vai criar, no site, um espaço para capacitação virtual de empreendedores.
Pequenas têm 37% do total
O governo tem interesse em abrir novas oportunidades como essas. Só no ano passado, a presença das micro e pequenas empresas na apetitosa lista de compras federal deu um salto de 375%, depois da entrada em vigor da Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas.
Hoje, das 274 mil empresas cadastradas para vender a órgãos federais, 158 mil são desse porte. Em 2006, elas respondiam por apenas 9,6% do total, correspondentes a R$ 2,037 bilhões. Porém, no ano passado, esse número atingiu 37%, ou ainda, R$ 9,506 bilhões.
No caso das pessoas físicas, o volume de negócios correspondeu a 0,2% do total. Isso significa que dos R$ 34 bilhões que o governo gastou com produtos e serviços, R$ 57 mil foram pagos a elas. O secretário de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento, Rogério Santanna, conta que, até hoje, os produtos e serviços de pessoas físicas foram entregues com qualidade e nos prazos estipulados pelos editais: — Os valores, nesses casos, são baixos. Isso facilita. Em 2007, fechamos negócios de mil reais, R$ 1,8 mil. Quase sempre, para prontaentrega: ou seja, a pessoa podia nos atender imediatamente.
A participação de micro e pequenos empreendedores no portal Comprasnet depende do cadastramento, feito pelos próprios interessados — que dão informações online sobre si próprios ou sobre constituição, localização e identificação societária das empresas. Depois, torna-se obrigatório o comparecimento a um órgão público que verifique a autenticidade das informações registradas na internet (a lista de endereços pode ser conferida no próprio portal). É que uma venda no pregão eletrônico só será efetivada se o empreendedor tiver, antes, comprovado seus dados.
Por isso, a necessidade de se apresentar pessoalmente. Após mostrar a documentação necessária, o interessado é incluído, gratuitamente, no Cadastramento Unificado de Fornecedores (Sicaf): recebe não só login e senha para oferecer preço nas licitações como um número com o qual fica autorizado a entregar mercadorias e serviços ao governo. Passa a ter, ainda, acesso ao catálogo eletrônico do sistema de compras, além de editais disponíveis e de uma lista que informa quem vende o quê.
Dono da Malharia Thomazini, em Mesquita, na Baixada Fluminense, o empresário Valdecir Thomazini usa o Comprasnet. Pelo site, ele vende uniformes escolares.
— Percebi que os leilões eletrônicos eram uma boa oportunidade há algum tempo, em 2002. Naquela época, eu produzia duas mil camisetas por semana. Atualmente, são 30 mil.
À venda, bandeiras e barracas
Fabricantes de tecidos, mapas e móveis também fazem negócios
Entre os bens mais comprados pelo governo estão combustíveis, equipamentos e artigos de uso médico, dentário e veterinário e produtos de informática. Nos últimos anos, esses três itens se revezaram entre os mais procurados. Mas a máquina pública também consome das pequenas empresas materiais de subsistência, ou seja, alimentos, principalmente para as Forças Armadas e de construção. Esse rol de bens inclui ainda tecidos, couro, mapas, barracas e bandeiras, móveis e ferramentas manuais.
O fornecimento de serviços é mais variado. Entre 2005 e 2007, os órgãos do governo alternaram as maiores demandas: além de passagens para viagens, o governo tem procurado suporte de equipamentos, como informática, serviços de limpeza e até consultorias de gerência e gestão.
As oportunidades são informadas pelo site. É possível adaptar o sistema, até, para selecionar as opções por região geográfica de interesse do empreendedor. É assim que pessoas físicas e jurídicas enviam seus lances, participando de sessões públicas virtuais.
Secretário diz que sistema de computador garante lisura
Segundo o secretário de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento, Rogério Santanna, essa é uma forma de o governo conseguir produtos e serviços de maior qualidade a preços competitivos.
Além disso, conta ele, o suprimento de produtos torna-se mais fácil e rápido: — Há casos, por exemplo, em que os comandos da Marinha e do Exército não encontram quem possa fornecer produtos, como coturnos, botas e até roupas especiais.
Santanna ressalta, ainda, que a lisura dos processos licitatórios é garantida, uma vez que toda a negociação é realizada de forma eletrônica.
— É o computador que fecha o negócio, avaliando, quase sempre, três ou quatro cotações — explica o secretário do Ministério do Planejamento, acrescentando que os prazos de entrega dos produtos são determinados pelo edital de cada pregão. — E, normalmente, a qualidade da entrega é boa. Nunca ouvi reclamações sobre produtos ou serviços.
O Comprasnet não é a única forma de negociação com o governo federal. A empresa de robótica aplicada Ativa — que desenvolve robôs especializados na prevenção de problemas em plataformas de petróleo — fornece tecnologia para a Petrobras, com verba da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). Criada, há dois anos, na incubadora de negócios da PUC-Rio, a empresa recebe pagamento através da universidade.
Os empresários André Souza, Daniel Camerini e Rodrigo Carvalho foram escolhidos depois de responderem às chamadas públicas dos editais: — A gente conversa com o pessoal da Petrobras para desenvolver aqui uma tecnologia que é comprada lá fora — explica Souza.
O passo-a-passo da negociação
Pessoa Física
Cidadãos devem apresentar carteira de identidade, CPF e comprovação de endereço. Entre os principais itens comprados em 2007, estão produtos agrícolas e móveis. Aluguéis e atendimento médico estão entre os serviços mais procurados.
Pessoa jurídica: Exige-se carteira de identidade e CPF dos dirigentes; Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ); registro comercial (no caso de empresa individual); comprovante de domicílio; ato constitutivo, estatuto ou contrato social em vigor, devidamente registrado (no caso de sociedades comerciais) ou acompanhado de documentação de eleição de seus administradores (nas sociedades por ações). Sociedades civis sem fins lucrativos ou de utilidade pública precisam de ato constitutivo, acompanhado de prova da diretoria em exercício. Outro documento, nesse caso, é o registro ou certificação de fins filantrópicos e/ou ato de declaração de utilidade pública. Empresas ou sociedades estrangeiras devem ter decreto de autorização e registro para funcionamento.
Site: O cadastro é feito no www.comprasnet.gov.br.
Comprovando dados: O cadastro online não basta. Pessoas
físicas e jurídicas precisam comprovar dados pessoalmente (endereços no site).
O Globo – RJ, Economia, Flávia Rodrigues e Gustavo Paul, 30 de março de 2008