General
“É um erro afirmar que internet é terra de ninguém. É de todos!”

"Dizer que a internet é terra de ninguém implica inicialmente em dois erros. O primeiro é inferir que ninguém se importa e ninguém cuida. O outro é esquecer que todos são responsáveis pelo que publicam ali", afirmou o vice-coordenador do Centro de Tecnologia e Sociedade da Fundação Getulio Vargas (FGV), Carlos Affonso, em debate sobre governança da internet realizado durante a tarde de ontem, 9, na Campus Party.
Para entender essa discussão sobre a governança da internet no Brasil, é necessário voltar ao início do debate, quando Hartmut Glaser, secretário executivo do Conselho Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), explicou como o processo funciona. "Há 17 anos atrás, a internet começava no Brasil e era essencialmente acadêmica. O governo decidiu que era necessário gerir (a rede) e montou um comitê com 9 pessoas, representando a academia, governo, terceiro setor e sociedade", lembrou Glaser.
Atualmente, 21 membros compõem o comitê, sendo quatro do setor empresarial; quatro do terceiro setor; três da academia; nove do governo e mais um, que é um representante especialista em internet. "Há 8 anos, os membros são escolhidos de forma democrática", explicou o representante do CGI.br.
Interesses privados não podem se sobrepor aos públicos
O modelo multissetorial encontra resistências, mas, de acordo com Rômulo Neves, do Ministério das Relações Exteriores, "divergências são absolutamente naturais em ambientes plurais. O comitê é importante para dissolver, às vezes, opiniões extremadas", concluiu.
Vagner Diniz, gerente do W3C Escritório Brasil e mediador do debate, concordou com Rômulo: "com a diversidade na governança da internet, garantimos que os interesses privados não se sobreponham aos interesses públicos", disse, ressaltando que interesses públicos não significam "interesses do governo".
Governança no dia a dia
O trabalho do comitê pode passar despercebido pela maioria. Veridiana Alimonti, que acumula o trabalho do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) com suas atividades no Comitê de defesa dos usuários dos serviços de telecomunicações (CDUST) da Anatel, além de suas tarefas no CGI.br, exemplificou como a governança acontece no dia a dia: "Quando você não consegue usar o VoIP ou não consegue assinar banda larga, porque não chega à sua região, é trabalho do comitê buscar alternativas para resolver o problema”, afirmou. "Além disto, o comitê é que discute regras de utilização e faz a mediação de contribuições referentes aos temas correlacionados com a internet".
Punição do intermediário
Veridiana revelou uma das discussões em pauta pelo comitê: a punição do intermediário. Nesta semana, o sítio Twitter recebeu uma advertência sobre a conduta de perfis que divulgam onde encontram-se blitz da lei seca. Ou seja, o Twitter, como intermediário, foi punido por conteúdo postado por seus usuários. Há poucas semanas, o dono do serviço Megaupload foi preso na Nova Zelândia, por motivo semelhante: ser facilitador de violação a direitos autorais.
Segundo Vagner Diniz, quem deve ser punido (e se alguém deve) é uma discussão que ainda deverá estar em pauta por algum tempo. De acordo com Everton Lucero, do Ministério das Relações Exteriores, um dos primeiros grandes problemas na área surgiu no Orkut. "Quando apareceram as primeiras denúncias de uso do Orkut para pedofilia, a Google foi acionada e declarou que não era responsável e que seu servidor estava fora do Brasil, isentando-se de responder às leis nacionais", disse Everton.
Fake e meme em debate
Além da questão do intermediário, outra discussão incipiente é o uso crescente de fakes e memes. De acordo com Vagner, o uso do anonimato ou do fake dificultam o acesso ao autor, mas não é impossível identificá-lo. Com relação aos memes, Carlos Affonso declarou: "O meme deve ser levado a sério, porque ele geralmente usa conteúdo autoral alheio, mas transformado, comunicando algo novo".
Após noventa minutos de debate, todos chegaram ao consenso de que a melhor forma de garantir uma boa governança da internet é continuar envolvendo os múltiplos setores da sociedade, para preservar pluralidade, colaboração, criação coletiva e, sobretudo, ética.