Artigo
GESTÃO
Carta de Gileno Barreto aos serprianos
Prezados colegas do Serpro,
Permitam-me dirigir-me a vocês como colegas. Trabalhamos juntos há três anos, e muitos de nós nos tornamos amigos, juntos nessa jornada de ter o Serpro relevante para essa nova sociedade, a sociedade de informação e da tecnologia.
Fui convidado para trabalhar com vocês, como um profissional técnico que sou, justamente por crer no futuro dessa nova sociedade, que cada qual na sua individualidade a constrói, uma sociedade livre, informada, tecnológica, que para isso entende e inclui cada um, independente de raça, crenças, e também de credos políticos.
Vocês me conhecem há três anos e sabem do meu respeito a cada indivíduo, a cada serpriano. Sabem que todos trabalhamos juntos para um bem comum, administrar essa empresa para os 200 milhões de contribuintes, que são os donos dessa empresa, não para grupos de interesse, essa é minha filosofia.
Claro que divergimos em alguns momentos, e o embate se faz necessário para que o diálogo ocorra e, para chegarmos a um denominador comum, que concilie os interesses individuais, dos grupos, e dos brasileiros.
Entretanto, fui surpreendido nesta sexta-feira (26/8) por um vídeo, livremente transmitido pelas mídias sociais - como deve ser - cujo conteúdo, porém, pode ser ofensivo para alguns. Por isso, me dirijo a vocês pessoalmente, individualmente, para manifestar meu desagravo. Essa não é uma manifestação da Diretoria, ou do acionista, ou do governo, ou do Estado. É minha.
Eu fui criado em uma família com diferenças de credo, político e religioso. Aprendi com isso o valor da liberdade e da democracia – nem ao povo é dado o direito de subverter a ordem democrática, como disse Thomas Jefferson. É o pior regime, depois de todos os outros, como disse Churchill. E nisso eu creio.
Casei-me com uma mulher judia, crença diferente da minha. Tive duas filhas, que são criadas dentro dessa religião. E essas pessoas foram, há apenas 70 anos, humilhadas, despojadas e mortas, sob o pretexto do facismo – a que esse vídeo me classificou –, que pregava a suposta pureza da raça, em resumo, um rótulo associado a crenças anti-democráticas, que atualmente certos grupos as utilizam como “pecha” para rotular qualquer um que divirja da suposta opinião política contrária, sem que aos contrários seja dado o direito à defesa.
Pessoas têm sido presas ou sofrido coação, apenas por manifestar sua opinião contrária à uma crença política, que alguns indivíduos interessados apenas no seu próprio patrimônio, obtido por meio do passado domínio do Estado, ou de algum estamento, as tem feito agir sem pensar, sem o devido respeito aos direitos alheios, pessoas que sob esse pretexto subtraíram no passado o patrimônio dos seus próprios pares trabalhadores, poupado por meio dos fundos para sua própria aposentadoria.
Assim, gostaria de manifestar meu absoluto desagravo ao dito vídeo, de mau gosto, que indiretamente me classificou como alguém que praticou os mais indeléveis crimes e, que por isso, ofendeu não a mim, mas à minha esposa, minhas filhas, muitos amigos e colegas e, principalmente, todos aqueles que realmente precisam de respeito, aqueles que buscam reconhecimento, aqueles que têm um visão distinta de mundo, aqueles com necessidades especiais, às mulheres e, principalmente, às mães, à minha, às mães daqueles que fizeram aquele vídeo sem a devida reflexão, às mães que são católicas, evangélicas, das religiões afro-brasileiras, e também as judias, que foram assassinadas indiscriminadamente aos milhões, tanto na Europa quanto na União Soviética. Mães que foram assassinadas no Brasil, como vocês assim o sabem.
As nossas diferenças pessoais não podem nos permitir ofender essas pessoas, que por um acaso da vida são meus familiares e de muitos serprianos, mães que são iguais a nós, que buscam a todo dia seu sustento em uma sociedade como a brasileira, plural, diversa, e que aceitou no passado e aceita hoje todos os imigrantes, estrangeiros e judeus, que aqui encontraram um porto seguro para a sua fé, seus costumes, suas crenças, e que nos ensinaram e que nos ensinam a tecnologia, a medicina, a música, que valorizam o estudo e o respeito ao próximo.
Por isso, peço a todos que, ao postar ou ao se manifestar como serprianos, lembrem-se dos sentimentos daqueles que são diferentes, e que sofreram ao longo da história. Lembrem-se da história, para que não se repitam os erros cometidos no passado.